quarta-feira, julho 20, 2016

Passeio pela Literatura - 2



O esquecido livro “O Ateneu”, de Raul Pompéia, de 1888, é irmão gêmeo do “Dom Casmurro”, de Machado de Assis, de 1899 – ambos são fruto desse Realismo tardio brasileiro, que acaba por se confundir com o Impressionismo: ambos são um relato em primeira pessoa, ambos afastam o tempo da ação do da narração, ambos registram impressões do passado não comprováveis e, portanto, não críveis, ambos são versões parciais... Mas, é claro, como bivitelinos que são, apresentam muitas diferenças entre si, a exemplo do tema e do estilo, cujas marcas sempre identificam, de forma exclusiva, um modo de escrever e uma personalidade.
“O Ateneu” é um romance de formação, expressão usada para identificar livros que registram a passagem da adolescência para a vida adulta de um personagem: no caso, Sérgio, o narrador, relata as experiências que vivenciou num internato de nome Ateneu, quando tinha treze anos. Como foram vivências resultantes de acontecimentos impactantes na sua negatividade, o livro é considerado naturalista, ou seja, carrega ideias deterministas que consideram o meio um elemento degradador dos personagens. Mas o livro não tem a clareza que costuma aparecer em romances desse tipo, nem simplifica as relações de causa e efeito; nesse sentido, classificá-lo é quase impossível, já que, no texto, se insinua, além da falta de nitidez, uma avaliação subjetiva demais para ser aceita como verdade única.
Em relação ao estilo, a reverência à erudição vocabular e linguística ainda o situa no final do século XIX, quando os escritores – Coelho Neto, Rui Barbosa, Olavo Bilac, Euclides da Cunha, entre outros – primavam pela perfeição gramatical e pela rigorosa seleção lexical, comportamento esteticista e perfeccionista só mais tarde questionado.
Nesse sentido, “O Ateneu” só pode ser entendido como um livro mestiço − mescla elementos românticos (já que carrega nas tintas emocionais e subjetivas), naturalistas (em virtude de a negatividade do ambiente vitimar os personagens), realistas (por causa do desmascaramento moral da classe dominante), impressionistas (porque quebra a nitidez) e mesmo expressionistas (uma vez que antevê o traço exagerado e caricatural) – e nunca se deixa classificar facilmente.