sábado, setembro 02, 2006

Jogo de trevas

DOS ESCRITOS DE ANTÔNIO: AS ANGÚSTIAS DO POETA

IV

I
Quem me dera...
ser filho
da possibilidade inusitada
da Noite de Natal.
E quem me dera...
ser o Renascido
irmão gêmeo e amigo;
guia de minha procura,
também como Ele incansável.
Mas não me quis
por gêmeo
o Deus-amor.
E cá estou eu:
gêmeo-siamês do Diabo
e cúmplice desse anjo louco que traiu,
envolto em sombras
e nada mais.
– Há séculos que não vejo a luz –.
E até o fogo que me queima a alma,
uma chama que me foi dada,
não a pude olhar de perto:
a escuridão é venda grossa,
não me permite outras visões.

II
Agora vê, ó Deus
que me fizeste;
aqui, não pude ser filho da paixão
nem teu irmão;
acolá, deste-me de presente,
como um grego,
os martírios de tua morte,
em meio à minha vida.
Como podes, Louco Maior,
depois disso e mais ainda,
chamar a minha alma sufocada,
como o fazes
continuadamente,
a que permaneça
à Tua direita
e à de Teu Pai,
imantada à Tua força
que a atrai?
Tu não me quiseste como irmão!
Deste-me dor e nada mais!
Nem que ilegítimo,
não me deixaste ser filho
do Espírito maravilhoso
da noite de Natal!
Não achas Tu que mereço a Paz da Tua ausência?