A agulha e seu limbo
Na minha bússola diferente
está guardado um lugar
onde a viagem comprida
encontra seu porto, afinal.
Uma viagem sozinha
com essa bússola
divergente...
Os remos, pedaços de fogo
na salmoura do vento;
as velas, pancadas brutas,
dessas inesperadas.
É uma bússola bonita
que aponta sítio encantado
com um tesouro escondido:
o mundo inteiro consertado
ao alcance da mão;
o vento alivia o esforço
a chuva lava o cansaço;
o amor (e seus inclusives)
triunfa, aliviado,
depois da última luta.
Mas ninguém sabe essa bússola
fechada dentro de mim
a chave caída no mar
com indícios de ferrugem.
Por isso a mão,
mesmo ferida do remo,
abriu o mar, ajudando,
o rumo contra as correntes.
E o vento no meu rosto
esculpiu aquilo que sou:
esse perfil exclusivo,
talhado durante o trajeto,
vem da viagem rara
que a bússola especial
me obriga a navegar.
(Difícil à noite
manter a rota,
nas tempestades,
na solidão;
o céu escuro,
cheio de nuvens,
vazio de estrelas
e indicações...
Sereias lindas
confundem o leme
ofertam mapas
fáceis demais...)
Minha bússola
(essa agulha imantada
dentro do seu limbo graduado),
apesar de seus ângulos
de medição assimétrica,
levará meu navio
na direção do tesouro:
no espelho,
verei meu rosto
mais verdadeiro;
na aurora clara,
divisarei nítidos roteiros;
não temerei
nenhuma mão estendida;
descansarei, sossegada,
no abraço que preciso.
10 Comments:
Querida Flávia
faz tempo que não leio uma poesia tão linda e tão forte !!!
Maravilhosa !!!
bjs
Rosário
É preciso ser provida de uma áurea maravilhosa, de um espírito lindo pra fabricar uma arte tão bela quanto essa. Tomei a liberdade de tecer um comentário aqui, depois de ser encorajado por você hoje. O papel social que tens ao escrever uma poesia tão bela é imenso, pode ter certeza. Não sei se acreditas em grandeza das faculdades espirituais, mas eu tenho certeza que você é especial por conta da virtude de ensinar e escrever com tanta maestria.
Fica aqui o abraço de um aluno insolente, que teve o atrevimento de comentar nesse espaço maravilhoso, onde você expressa sentimentos como quem sopra bolhas de sabão...
Elton.
Oi Flávia!
Eu fui sua aluna em 2006 e hoje estou estudando Eng. Agrícola e Ambiental na UFV, Viçosa-MG. Distante da minha casa, da família e dos amigos, sempre que posso venho aqui no seu blog ler alguns textos para refletir um pouco ou até mesmo rir um pouco (detalhe, é q estou usando o computador do laboratório e as pessoas ficam olhando para mim querendo saber o motivo, kkkk...).
Amei sua poesia. Sou até suspeita de falar porque já sou fã dos seus textos. Lembro bem dos textos que você levava para aula e falava que precisava de público leitor hehehehe...
Beijos...
Querida professora: Adorei sua aula de ontem 6-9-2009 (Português, Literatura, História, Geografia, Filosofia, Sociologia... Essa poesia está muito relacionada à mnha vida. Deus lhe ilumne sempre, espero ter outras aulas com você.
César Romero A. das Neves - EREM Desembargador Renato Fonseca Olinda
Significado da sigla SUV'S - Sport Utility Vehicles - Veículos Esportivos Utilitários
Flávia,
quero recomendar o blog de um amigo, , tambem escritor de coisas belas, como você. Já recomendei o seu para ele. Veja o que ele falou sobre o caso do voo da Air France.
Bjs
Rosário
http://carlomacedo.blogspot.com/
Seja bem vinda, argonauta!
Um beijo.
Luis Manoel Siqueira
Flávia querida:
É belo e forte o poema!
Um beijo.
Paulo Gustavo
Espero ver essa mulher linda encontrar chave, bússola e sentimentos não através da poesia, mas na realidade.
um beijo.
curti o seu gole d'água prof. vai se escorando que é pra nem cansar.
Fim de um favelado
Após várias horas, dirigindo pelos arrabaldes; adentro às avenidas e quarteirões cercados por mansões e prédios intocáveis pela percepção ocular. Subitamente fixo o olhar naquele aglomerado miserável que segue margeando córregos e subindo morros.
Reduzo a velocidade, impactado pela paisagem urbana, retratando aspectos sociais e econômicos que denunciam a presença de uma parcela da população desprovida de regalias ou sequer de uma infraestrutura apropriada à sobrevivência digna mínima.
Paro minha Hilux diante da estreita ala rochosa que dá acesso ao precário complexo habitacional. Desço e começo a percorrer aquele vão imundo, escuro e de uma fedentina indescritível. Deparo-me com um moleque de mísera aparência: cabelos arrepiados, olhos arregalados como que de pavor, rosto sinistro, maltrapilho e sujo.
Ao perceber meu olhar insistente, tenta fugir. Porém, meto a mão no bolso do casaco e tiro um pequeno embrulho o qual lhe atrai a atenção. Estendo-lhe a mão num gesto de oferecimento. Ele se aproxima, recebe desconfiado e recua alguns passos sem se virar. Sorrio para o mesmo, que tenta retribuir com um gingado, expondo assim, sua identidade cultural afro-brasileira.
Mal começamos uma relação amistosa, fui surpreendido por três homenzarrões que apressados avançam em sua direção, conduzindo metralhadoras.
Sacam suas armas e apontam para o garoto, atirando logo em seguida.
Estagnado, assisto àquela triste e aterrorizante cena.
Volto estupefato ao automóvel e regresso sentindo-me impotente diante da dura realidade presenciada na favela.
Só no dia seguinte, tomo conhecimento, através dos jornais, sobre o verdadeiro motivo daquela dolorosa execução: tratava-se de uma queima de arquivo.
Laurinete Oliveira da Silva
RG 1674519
Escola de Referência em Ensino Médio de Timbaúba
Postar um comentário
<< Home